Adoro os milagres que acontecem nos programas de culinária. É aquele local mágico onde os cozinheiros picam cebola sem chorar. Onde os vegetais entram às rodelas e saem caramelizados.

Dei por mim a pensar que há coisas na vida tão, tão chatas que mereciam este tipo de milagre. Um pequeno twist, daqueles à Masterchef, para ficarem mais chiques e mais gourmet.

Veja-se, por exemplo, um caso da vida real: os impostos não seriam tão chatos se fossem servidos em caminha de grelos. Deixavam de ser tão“enfarda-brutos”. Sendo que nos brutos cabemos todos nós, prezados contribuintes, deitados com o inimigo na caminha de grelos quando tudo o que queríamos era uma vichyssoise às colheres, de preferência 14, com croutons de Natal e férias.

Com o IRS fazíamos uma redução, em lume brando, de forma cautelar (uma técnica que está muito na moda agora) para apurar o efeito flambé na massa folhada de cidadãos. Por fim, um pijaminha de doces: sericaia com ameixa, IRC em ponto rebuçado e bavaroise de rainhas cláudias – a única figura política que toleramos em sobremesa.

No plano familiar podíamos, porventura, saltear a sogra com azeite e alho antes do primeiro embate. Seria muito menos violento para o paladar já que prová-la assim crua, sem nunca ter experimentado, é coisa para dar azia.

Ou então levá-la ao frigorífico por umas horas, de modo a conseguir aquele paladar gelado que deriva em anestesia e torna tudo indolor.

Depois, é arrotar o excesso e giboiar o resto, que já estava tudo a ficar muito chique.

(artigo publicado no blogue amigo “Do Prato à Boca”. Podem conferir aqui, vale a pena espreitar e babar: http://pratoaboca.com/2014/03/11/caramelizar-o-dia-a-dia/ )