Não há nada mais ternurento do que aquele momento em que nos estão a dar direções para um caminho, nós não percebemos um boi, e a pessoa que nos está a tentar explicar exaspera, desiste de esbracejar, e começa à procura de formas alternativas de explicação em objetos vizinhos completamente aleatórios.
Normalmente começa assim:
– “Nós estamos aqui” – e apanha o pimenteiro. “Tu queres vir para aqui” – o saleiro. E de repente, o nosso caminho é um carreirinho de talheres e tudo faz sentido.
Foi assim que um dia, em menos de nada, a minha mesa de jantar virou mapa do centro de Lisboa, onde o Marquês de Pombal era o porta-guardanapos, e eu tinha de sair no garfo, isto é na Duque de Loulé, e não na colher, que é uma traiçoeira saída para o Saldanha e aí só saindo da mesa para o vazio e fazendo marcha-atrás é que podia voltar ao porta-guardanapos. Chegar lá só pelo túnel do Marquês, ali ilustrado com vários anéis de guardanapo unidos, para não restarem dúvidas quanto à natureza tunelesca do dito.
Um mapa com uma escala tão grande quanto uma cozinha pode ser e tão complexa quanto os utensílios que pode conter. E não, não há nenhum adulto que se considere demasiado adulto para isto. Já vi grandes mapas desenhados em bacalhau à brás, ou roteiros completos ilustrados à base de nódoas de vinho.
E o que tem piada é que qualquer transeunte olha de fora e só vê dois adultos, de feição carregada e ar mortalmente sério, a analisar uma mesa cheia de utensílios culinários, empilhados de forma bizarra, como se fosse a nova maquete do Le Corbusier.
Eu nunca primei pelo sentido de orientação mas nem 8 nem 80, gente. Seca-se-me o coração quando peço indicações e recebo 8 esbracejares de braço na atmosfera. Obrigadinha, são 5 minutos de pura emoção braçal mas eu já nem me lembro do que fazer na primeira rotunda, e Deus me livre voltar a perguntar, se é para voltar a ver a Macarena.
Mas sair no garfo, ora aí está uma boa mnemónica.
Oxalá todos os problemas da vida pudessem ser resolvidos com um trem de cozinha.