Isto de trabalhar em ambiente internacional tem muito que se lhe diga. O meu escritório é um autêntico laboratório sociológico de sensibilidades e despiques culturais. Há tanta nacionalidade que às vezes já nem sei em que língua é que penso. Ou então, na hora de verbalizar, nem consigo decidir a tempo e sai-me um híbrido entre português, inglês e espanhol, e ninguém entende excepto talvez o Chewbacca, se estivesse presente.
Sentadas à minha frente estão as alemãs, que às 8h em ponto de segunda-feira já estão em reuniões produtivas e sérias. Ora, aí está o primeiro desafio de adaptação para os portugueses. Entre nós, é consensual que ninguém está em condições de pensar a uma hora obscena dessas. Não antes de varrer o jornal A Bola de uma ponta à outra e de comentar os ditos cujos conteúdos lidos n’A Bola durante dois cafés demorados. Mas elas trabalham, e devem produzir milhões para a empresa, porque eu pelo menos não teria coragem de dizer “nein” àquele idioma dos demónios.
E os italianos, mesmo nas secretárias atrás de mim? Ora, são 8h em ponto e já estão a falar sobre comida. Mozarella, bacon, com azeitonas é melhor, eu ponho-lhe uma clara de ovos. Eu ainda nem abri a pestana e já está o Andrea a exibir o seu tupperware cheio de pasta, a escassos centímetros do meu nariz – “Olha o meu almoço de hoje, nhami nhami” – a impregnar o ar com um cheiro a refogado que em qualquer outra altura do dia seria extremamente apetitoso. Mas não às 8h, Andrea.
Ao menos eu trabalho para Espanha e os espanhóis só acordam às 10h, sensivelmente. E depois fazem a sesta das 13h às 15h30. E depois voltam para se pirarem logo às 16h30/17h, para afinfar umas tapas. E é quando voltam, porque à sexta não se trabalha à tarde.
Silogismo contido neste raciocínio: vou emigrar para Espanha e compensar as sonecas dos últimos 25 anos.